Nesta altura já todos ouvimos falar sobre as estratégias para conseguir trabalhar eficazmente em modo remoto. Contudo, apesar de a forma realmente ter mudado, as pessoas com quem lidamos diariamente permanecem as mesmas. 

Em Human Consulting defendemos que os principais desafios vividos nas organizações se encaixam num de 3 pilares principais: falhas de comunicação, falhas na liderança ou falhas nas relações interpessoais; sendo que base das dificuldades de comunicação, relações interpessoais e liderança que vivemos em contexto de trabalho remoto não diferem das que vivemos quando lidamos com estes temas presencialmente, apenas a forma é que muda.

Assim, os temas como motivação, gestão de equipas, trabalho em equipa, engagement, comunicação, liderança permanecem tão relevantes em contexto de trabalho remoto, como presencial.

Enquanto seres humanos que somos, temos a tendência de criar ligações com os outros com base nas nossas semelhanças e diferenças. Por isso é que por vezes é mais fácil relacionarmo-nos com determinada pessoa e mais difícil com outra.

No entanto, se temos de lidar com pessoas diferentes, temos de realmente trabalhar o que nos afasta numa perspetiva de construção de “pontes” de relação. Para tal, necessitamos de começar por dar nomes a essas diferenças, isto é, de as incorporar num modelo explicativo que nos possa ajudar processar e a tornar consciente os nossos comportamentos e os dos outros. Assim, mais facilmente conseguimos baixar os níveis de defesa do nosso próprio ego e iniciar um novo caminho de aceitação com foco no fortalecer daquilo que nos une. Neste sentido, começamos a criar relações mais positivas e a conseguir gerir melhor quem nos rodeia (tanto em casa, como no trabalho).

Neste sentido, o principal objetivo com deste webinar é o de ajudar a criar um modelo mental explicativo das diferenças que acabam por dificultar a interação uns com os outros, independentemente do contexto.

Posto isto, iremos apresentar 4 questões gerais de um modelo explicativo de preferências, com o intuito de instigar uma nova perspectiva na gestão de pessoas. 

Estas questões têm por base um modelo conhecido - o MBTI - sendo importante reforçar que esta análise em particular não se trata de validar / definir o perfil MBTI de cada indivíduo, mas antes perceber quais são as diferenças base que nos distinguem e que são realçadas por este modelo.

No conjunto de questões que iremos apresentar, poderemos verificar que, no geral, existem 2 tipos de pessoas que respondem de forma distinta a cada questão. Já muitos nos deparámos com comunicações do género: existem 2 tipos de pessoas, as que comem uma fatia de pizza completa e as que deixam o rebordo da pizza no prato. Não quer dizer que quem come a fatia toda, por vezes não deixe o rebordo; nem que quem prefere deixar o rebordo, que também não consiga comer a pizza toda. O mesmo acontece com as perguntas que iremos analisar. Há genericamente 2 tipos de pessoas, mas ninguém é uma coisa ou outra - somos o conjunto das duas -, apesar de termos sempre uma tendência inata para uma das escolhas.

Neste sentido, para o conjunto de 4 questões seguintes, sugerimos que tente encontrar uma tendência de resposta sua e de alguém da sua equipa (preferencialmente alguém com quem sinta dificuldade em se relacionar):

Como prefere recuperar a sua própria energia?

Há 2 tipos de pessoas: as que preferem recuperar com outros (tendencialmente mais energéticas, expressivas e sociáveis) e as que preferem recuperar com elas mesmas (tendencialmente mais reservadas, reflexivas, e contidas na interação).

Onde é que estes 2 tipos de pessoas chocam mais na sua interação? 

No tempo que necessitam de despender com outros para se sentirem prontas para produzir algo. Enquanto que as primeiras, valorizam a discussão dos temas em equipa; as segundas preferem operacionalizar a sua visão e só depois partilhá-la

Transpondo estas diferenças para a nossa realidade em contexto de trabalho, enquanto que o trabalho presencial em escritório, na maioria das vezes em open space, privilegia muito mais quem tem uma preferência por recuperar energia com outros; o trabalhar a partir de casa sempre foi a assinatura de quem prefere recuperar energia consigo mesmo.

Seria então de esperar que no momento atual de trabalho a partir de casa, quem recupera energia consigo estivesse mais confortável do que quem recupera energia com os outros. Contudo, tal não é verdade quando quem recupera energia com os outros, por sentir falta da interação habitual para produzir, preenche o calendário de ambos com reuniões e grupos de discussão.

Sendo que encontramos os mesmos desafios fundamentais tanto na interação presencial como por via remota, as estratégias em busca de equilíbrio são as mesmas: colocar limites e respeitar necessidades. Enquanto que para os primeiros esta estratégia passa muito por criar espaço para partilha e envolver em grupos de discussão, para os últimos passa por apresentar um desafio / meta / tarefa e permitir que trabalhem sozinhos no tema.

 

Como prefere prestar atenção à informação?

Há 2 tipos de pessoas: as que preferem prestar atenção aos detalhes e aos factos e as que preferem uma visão macro e esquemática da informação

Qual é então o tema que torna difícil a interação entre estes 2 tipos de pessoas?

É na quantidade de informação que necessitam para se sentirem seguros sobre um determinado tema.

Se preciso de comunicar algo e se sou uma pessoa com atenção ao detalhe, dou e espero que me deem informações com mais pormenor; por outro lado, se sou uma pessoa com uma visão mais macro, dou e espero receber a informação principal, o resumo 

Transpondo isto para a nossa realidade de trabalho, estas diferenças podem particularmente ser reveladas através da comunicação por email – e, mais uma vez, isto verifica-se tanto em contexto presencial como remoto, já que o email é muito usado em ambos os casos:  

  • há pessoas que escrevem emails de forma a assegurar que está tudo bastante explícito (e as outras não vão querer ler tanto texto) - estas têm tendência para o detalhe
  • e há pessoas que colocam preferencialmente 2 ou 3 bullets para explicar uma teoria (sendo que as primeiras vão ter imensas questões a colocar, pois sentem não estar explícito) - estas têm tendência para a visão macro.

Que estratégias podemos então aplicar? 

Quem tem tendência para o detalhe poderá começar os seus emails pelo resumo - ir directo ao assunto - mesmo que depois sinta a necessidade de explicitar em baixo (pelo menos já garantiu à partida que o essencial é captado por todos). Por sua vez, quem tem tendência para a visão macro, poderá, sem criar julgamentos, garantir um tempo e espaço (mesmo que limitados) para responder a dúvidas e questões. 

Como prefere tomar decisões? 

Há 2 tipos de pessoas: as que preferem tomar decisões com base na emoção e as que tendencialmente tomam decisões com base na razão.

Este é provavelmente o tópico que mais dificulta a comunicação entre as pessoas, já que são 2 formas muito diferentes de interpretar o mundo e tendemos a julgar o outro por não compreendermos o seu processo de raciocínio.

Apesar de o principal de desafio entre estes 2 tipos de pessoas ser o de dar e receber feedback, porque damos feedback da forma como gostaríamos de receber  - e os primeiros gostam de um feedback mais directo e conciso enquanto que os segundos preferem alguma atenção à forma e às palavras que se utilizam -, o tema que gostava de realçar é a capacidade de conseguir separar a vida pessoal e a vida profissional.

Enquanto que quem toma decisões com base na razão normalmente separa com maior facilidade a vida pessoal da profissional e “trabalho é trabalho”; quem toma decisões com base na emoção, normalmente vê-se a si mesmo e aos outros como um só, um ser holístico, levando muitas vezes temas de casa para o trabalho e do trabalho para casa.

Assim, transpondo estas diferenças para o momento atual que vivemos - e porque a situação que hoje experienciamos não é de trabalho remoto, é de trabalho em quarentena! -, a forma como cada um destes 2 tipos de pessoas lida com o facto de ter de estar a trabalhar durante uma situação de pandemia também é distinta.

Não quer dizer que quem tem tendência mais para a razão não sinta o impacto nem receio nesta situação de incerta (somos todos seres emocionais), mas provavelmente consegue focar mais facilmente e criar uma espécie de bolha quando entram em modo trabalho. 

Por sua vez, quem tendencialmente está mais conectado com a emoção, poderá ter mais dificuldade de neste momento manter a mesma motivação e foco no trabalho.

Por isso, as estratégias que gostava de realçar são: 

  • o não julgar (que é logo a tendência de quando estes 2 perfis se encontram numa interação)
  • o dar espaço para partilhas e desabafos de quem tem tendência para tomar decisões com base na emoção (principalmente no início de conversas) 
  • e o não exigir essas mesmas partilhas e interesses pessoais de quem toma decisões com base na razão

Como prefere lidar com o mundo à sua volta?

Há 2 tipos de pessoas: as que preferem ter a vida controlada e organizada e as que preferem ter as opções em aberto privilegiando a espontaneidade dos momentos.

Este é provavelmente o tópico que mais impacto poderá ter nesta possível passagem futura de trabalho presencial para trabalho remoto. 

Porque apesar de a população portuguesa ter uma tendência clara para deixar as coisas para última hora e desenrascar com sucesso – que é a tendência de quem prefere a vida com opções em aberto – as organizações sempre puxaram mais para um lado controlado, com um horário fixo das 9h às 18h, 1h de almoço das 13h às 14h, com um controlo presencial bastante reforçado.

Nesta passagem para o trabalho remoto o paradigma muda e o trabalhar por objetivos, por apresentar os resultados num determinado deadline – que é muito defendido por quem gosta de ter as opções em aberto – na minha visão, passa a ser a forma privilegiada de se trabalhar. O foco deixa de ser no controlo do processo e passa a ser no controlo do resultado.

Porque ambas as pessoas chegam de A a B, a forma como o fazem é que é diferente, uns gostam de controlar o caminho até lá, outros até podem planificar mas depois “a vida acontece”. 

E é neste choque que normalmente quem gosta de manter um planeamento acaba por se sentir mais frustrado e sem suporte, enquanto que quem gosta de ter as opções em aberto é capaz de sentir sufocado quando lhe começa a ser exigido que siga ou construa uma estratégia / planeamento muito fechados com base na visão de outros.

Aqui as estratégias base de conseguir lidar com estes 2 perfis são: o responsabilizar e confiar. Isto é, as pessoas mais controladas e organizadas começarem a confiar que o trabalho estará pronto a tempo e horas e, por isso, a controlarem menos o processo até lá, responsabilizando o outro pelos seus resultados; e as pessoas que preferem as opções em aberto, a confiar que podem começar por percorrer o planeamento sugerido ou criar estruturas e planificações que transmitam segurança aos outros e, a partir de provas práticas e concretas já operacionalizadas, começarem a mostrar que podem fazer à sua maneira sem comprometerem o resultado.

Mais uma vez, isto tudo é tanto aplicado ao contexto de trabalho presencial como em trabalho remoto.

Porque o contexto muda, mas as pessoas são sempre as mesmas

Neste sentido, tanto trabalhando num escritório em open space como trabalhando em remoto a partir de casa, as dificuldades e os atritos permanecerão caso não sejam criadas estratégias e limites que assegurem um equilíbrio entre as diferentes formas de ser / estar / pensar.

Tal como reforcei no início, o termos olhado de forma geral para este modelo não significa que o vosso perfil seja o que vos pareceu ser a vossa preferência - daí que não tenhamos feito uma associação directa ao MBTI -, da mesma forma que também não significa que “a outra pessoa” que tenham tentado encaixar nas questões apresentadas, realmente se posicione ela própria dessa forma - o facto de eu achar que a outra pessoa é claramente “a pessoa que come a fatia de pizza toda”, não quer dizer que ela realmente se identifique com essa preferência. 

Daí a importância da aplicação de ferramentas e de programas de desenvolvimento em equipa, pois, por vezes, as perceções negativas que já criámos uns dos outros são os primeiros muros a terem de ser destruídos antes da criação das pontes positivas de relação.

Espero que esta informação vos seja útil e que possam olhar de forma diferente para a gestão das vossas relações (tanto a nível profissional, como pessoal).

Ana Lopes, Senior Consultant & Development