Quando falamos de trabalho remoto, já todos sabemos das principais vantagens, dificuldades e estratégias para manter uma rotina de trabalho e de equipa eficiente. Já aprendemos que é necessário manter o balanço entre a vida pessoal e a profissional e que para isso temos de criar uma rotina que nos permita distinguir as 2 faces da mesma moeda que é a vida. Sabemos que precisamos de tanto tempo a sós como em companhia de outros (ainda que por via digital) e que manter uma equipa unida é manter os laços pessoais entre os seus membros.

Mas na verdade, nada disto é novo: o contexto mudou, mas as pessoas de todos os dias permanecem as mesmas.

A base das dificuldades de comunicação, relações interpessoais e liderança que vivemos em contexto de trabalho remoto não diferem das que vivemos quando lidamos com estes temas presencialmente, apenas a forma é que muda.

Conhecemos as nossas preferências pessoais?

Conhecemos as preferências pessoais das pessoas que nos rodeiam? (seja em casa ou no trabalho)

Sabemos em concreto as nossas diferenças e semelhanças?

Conseguimos ultrapassar o que nos afasta e trabalhar no que nos une?

Seja em contexto de trabalho ou na nossa vida pessoal, as areias que muitas vezes se entranham e danificam a engrenagem que construímos para nos relacionarmos com os outros, advém de um desconhecimento e falta de aceitação do que cada um é e prefere.

Dar nomes a essas diferenças e semelhanças, ou seja, conhecer um modelo explicativo como base, permite ao nosso cérebro processar melhor os comportamentos daqueles que nos rodeiam, de tal forma que, baixando o mecanismo de defesa do nosso próprio ego, começamos realmente aceitar o que nos afasta e trabalhar pelo que nos une.

Neste sentido, deixo algumas questões gerais para que possamos começar a construir um possível modelo explicativo, sendo que podemos (e devemos) procurar as respostas tanto sobre nós mesmos como de quem nos rodeia:

Como prefere recuperar a sua própria energia?

Há 2 tipos de pessoas: as que preferem recuperar com outros e as que preferem recuperar com elas mesmas.



Como prefere prestar atenção à informação?

Há 2 tipos de pessoas: as que preferem prestar atenção aos detalhes e aos factos e as que preferem uma visão macro e esquemática da informação



Como prefere tomar decisões?

Há 2 tipos de pessoas: as que preferem tomar decisões com base na emoção e as que tendencialmente tomam decisões com base na razão



Como prefere lidar com o mundo à sua volta?

Há 2 tipos de pessoas: as que preferem ter a vida controlada e organizada e as que preferem ter as opções em aberto privilegiando a espontaneidade dos momentos

Embora adquiramos certos condicionamentos ao longo do tempo - e portanto, para uma validação das nossas preferências, ser necessário uma desconstrução e análise mais profunda destas questões (via online ou presencial) -, no imediato, refletir sobre as mesmas já nos permite perceber que todos somos seres humanos semelhantes, mas com formas de ser distintas.

Quando fazemos o paralelismo de como nos comportamos (ou preferimos comportar) no escritório (presencialmente) ou a partir de casa (remoto), as mesmas questões / fricções surgem, pois no final de contas permanecemos os mesmos, só as plataformas de interação é que mudaram.

Tomando a primeira questão mencionada (como recupera energia) como exemplo,  enquanto que o trabalho em escritório (principalmente em open space) privilegia quem tem uma preferência natural por recarregar energia com outros - já que passa a maioria do seu dia acompanhado -, poder trabalhar a partir de casa sempre foi a assinatura de quem tem uma preferência natural por carregar energia consigo mesmo. 

Poderíamos então deduzir que, nestes tempos de trabalho a partir de casa obrigatório, seria este último grupo de pessoas (as que recuperam energia consigo mesmas) que melhor se estariam a adaptar ao trabalho à distância. Contudo, tal não é verdade quando o seu dia de trabalho é preenchido por reuniões e videochamadas - promovidas muitas das vezes por quem recupera energia com os outros, pois sente falta das interações constantes a que estava habituado para conseguir realizar o seu trabalho.

Neste sentido, tanto trabalhando num escritório em open space como trabalhando em remoto a partir de casa, as dificuldades e os atritos permanecerão caso não sejam criadas estratégias e limites que assegurem um equilíbrio entre as diferentes formas de ser / estar / pensar.

No final de contas, sempre estivemos - e continuaremos a estar - dependentes uns dos outros para vencermos os maiores desafios e obstáculos. Por isso, aproveitar este tempo para tomar consciência, analisar e adaptar comportamentos na relação com os outros (tanto em casa como no trabalho), poderá trazer mais valias que não estarão dependentes dos contextos. 

Se “para irmos longe, é melhor irmos acompanhados”, então devemos sempre ter em atenção que, tanto no contacto presencial como digital, cada um de nós tem preferências e modos de ver a realidade distintos. Cabe a cada um nós saber gerir e integrar essas diferenças independentemente dos contextos e, assim, tornar muito mais forte o que nos une que aquilo que nos separa.

 

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Ana Lopes

consultora, human consulting, randstad portugal