O mínimo transforma-se no máximo, pelo menos uma vez por ano. Assume o centro das discussões, vai para manchete de jornal e tudo de repente parece depender dele, deste objetivo que é mínimo, naquilo que é o mais pequeno num cenário maior. Um debate que vira à esquerda e vira à direita, mesmo quando assumido que o mínimo não tem tido impacto no máximo, nem mesmo no médio.
E não se engane ao pensar que defendo que o mínimo se mantenha mínimo. Os salários em Portugal são efetivamente baixos e precisamos de mudar esta realidade. Mas esta estratégia não pode ser desenhada (apenas) no aumento do salário mínimo, até porque não está a resultar. Sim, não está a resultar, o médio não acompanhou a subida do mínimo e o mínimo continua mínimo mas cada vez com mais utilizadores. Se não está a resultar porquê insistir em repetir a estratégia, como se nada mais se pudesse fazer?
Temos de ter ambição, a ambição de aumentar a produtividade, de posicionar Portugal como um destino de investimento e gerador de emprego. Temos de nos destacar pela localização, pelas competências, pela segurança e pelas infra estruturas e não pelos preços e salários baixos. Temos que exigir, exigir às empresas, aos colaboradores, às pessoas, a nós próprios. Não podemos “assobiar para o lado” à economia paralela, ao trabalho não declarado e à “xico-espertice”. Porque a estratégia não é uma coisa dos outros, mas sim um desígnio nosso, em que todos podemos contribuir. Temos de tirar proveito deste reset ao mundo, refletindo e agindo não no interesse individual mas no coletivo.
Discutir o orçamento é sempre um processo complexo. É um (des)encontro de estratégias, uma luta de forças, uma discussão mas que tem sempre o mesmo grande objetivo. Nas nossas empresas fazemo-lo todos os anos e em nenhum coloquei em cima da mesa objetivos mínimos. Apontamos sempre para o máximo, para o concretizável. Utilizamos ferramentas de gestão seja na definição de metas SMART*, seja na inspiração de desenhar os nossos BHAG** para que seja possível a superação. Porque o orçamento não é um exercício de números, muito menos de política, é sim uma estratégia que concretiza uma visão comum. Um compromisso que nos guia para atingirmos o máximo, ultrapassando sempre, em muito, os mínimos.
* Specific, Measurable, Achievable, Relevant and Time-based
**Big Hairy Audacious Goal
artigo publicado no Expresso, 17.10.2020