Olhava novamente para as quatro paredes. Mas agora parecia que tinha mais tempo, tempo para refletir se todas estavam sólidas, se não poderia alterar alguma delas. Mais do que só a questão estética, era a altura de pensar no depois de amanhã, de repensar modelos e de avançar com a transformação. Parar é uma oportunidade para olharmos à nossa volta e colocarmos as questões certas. As perguntas, não só sobre o negócio e a sua abordagem, mas também questionar a organização e a estratégia de talento.
A cautela poderia ser má conselheira e re frear o ânimo para a mudança, afinal sem ter segurança não será ainda mais arriscado mudar?... A incerteza é parte do processo de decisão, saboreia-se em todas as mudanças, e mesmo quem não muda sofre da incerteza do contexto e também de tudo o que não tentou fazer, por medo, por receio.
A incerteza, a volatilidade, a complexidade e a ambiguidade — o VUCA que é a caracterização do mundo e dos mercados — são características que devem servir de aceleradores
A incerteza, a volatilidade, a complexidade e a ambiguidade — o VUCA que é a caracterização do mundo e dos mercados — são características que devem servir de aceleradores, criar momentos de reflexão e de reação, em que o motor do “hoje” pedala em conjunto com o do “depois de amanhã”, analisando não apenas o que os olhos veem, mas o estrutural, o que, se calhar, há muito não era questionado, porque não se tinha tempo. Esta é uma reflexão profunda que as empresas têm que fazer, um debate de lideranças que se devem despir do “porque sim” para se exercitarem como se fossem jovens startups, com a irreverência de quem sonha e com a experiência de quem já viveu muito. O melhor dos dois mundos: a criatividade e o conhecimento, em que não valem os “porque sempre foi assim”, onde não valem os álibis e se vive no desconforto de pensar diferente. Uma transformação que dói. Dói porque questiona todas as certezas, porque nos deixa desconfortáveis, nos desafia e exige novas respostas e competências. Um processo que também tem de olhar para as pessoas, não só para o que fazem hoje, mas para o que vão fazer amanhã, para tudo o que podem ser. Um processo que é também individual, uma ambição que o meu eu profissional tem de assumir, a gestão da minha carreira, o meu “depois de amanhã”.
in Expresso, Economia, 29 de janeiro de 2021