A maior parte das empresas compreende que precisa de atrair estrelas de topo – e competir ferozmente por elas – para prosperar no mercado. A dificuldade é conseguir fazê-lo de forma adequada. Num artigo publicado na MIT Sloan Management Review, os especialistas Josh Bersin e Tomas Chamorro-Premuzic deixam algumas dicas, identificando novas formas de avaliar talento e potencial.

 

O eterno desafio de encontrar as pessoas certas e alinhá-las com os cargos certos tornou-se ainda mais complexo agora que a Inteligência Artificial (IA) e a robótica estão rapidamente a mudar os empregos, e as competências técnicas necessárias são escassas. Enquanto a maioria das organizações ainda depende de métodos de contratação tradicionais como análise de currículos, entrevistas e testes psicométricos, uma nova geração de ferramentas de avaliação está rapidamente a ganhar terreno e, argumentamos, a tornar a identificação de talento mais precisa e menos enviesada.

Certas coisas permanecem constantes e não devem mudar tão depressa. Ao avaliarem os candidatos, os gestores tentam prever o desempenho profissional, analisando ao mesmo tempo o alinhamento cultural e a capacidade de desenvolvimento. Estudos mostram que os gestores procuram três traços básicos: capacidade, que inclui conhecimentos técnicos e potencial de aprendizagem; solidariedade, ou competências pessoais; e motivação, que envolve ambição e ética profissional.

Aquilo que necessitamos das ferramentas e métodos de identificação de talento – antigos e novos – permaneceu inalterado. Para avaliar a sua eficácia, devemos procurar uma forte correlação entre as classificações dos candidatos e o subsequente desempenho no cargo. Isto pode parecer óbvio, mas muitos recrutadores usam ferramentas baseadas na facilidade e na familiaridade – e raramente as ligam a resultados.

Os métodos de avaliação recentes podem ser agrupados em três categorias abrangentes: avaliação gamificada, entrevistas digitais e análise a dados dos candidatos. O que têm em comum é a sua capacidade de detectarem sinais de novo talento (ou seja, novos indicadores de potencial de desempenho). Aqui explicaremos como funciona cada um destes métodos e os seus pontos fortes e fracos.

 

Avaliações gamificadas

Uma nova vaga de testes psicométricos para o recrutamento concentra-se na melhoria da experiência do candidato. Estas ferramentas aplicam características de jogos, como feedback em tempo real, cenários interactivos e imersivos, e módulos mais curtos, que fazem com que os testes sejam mais aprazíveis. As escolhas e os comportamentos dos utilizadores são analisados por algoritmos computorizados que identificam a adequabilidade para determinado cargo.

Apesar dos benefícios da gamificação para o branding e o marketing, além do óbvio apelo de oferecer uma experiência de avaliação mais agradável – que pode resultar num número maior de candidatos – esta abordagem para a identificação de talento tem duas desvantagens. Primeiro, existe uma tensão natural entre divertimento e rigor. Quanto mais interessante e agradável a experiência, menos preditiva tende a ser, isto porque obter uma imagem abrangente dos antecedentes de um candidato exige testes mais longos e o tempo é inimigo do divertimento. Segundo, para oferecer uma experiência de avaliação “popular”, principalmente se for comparável a alguns dos jogos que as pessoas jogam por divertimento, os custos aumentam significativamente. Uma coisa é criar um tipo de Q&A normal, outra coisa é criar experiências de jogo imersivas para os candidatos – e os orçamentos de aquisição de talento são normalmente bastante limitados no que toca a ferramentas de avaliação.

 

Entrevistas digitais

O segundo grande desenvolvimento da identificação de talento é o uso generalizado de entrevistas digitais. À primeira vista, estas ferramentas assemelham-se a qualquer outra tecnologia de videoconferência, mas oferecem mais algumas vantagens.

Para começar, os entrevistadores ou responsáveis pelas contratações conseguem colocar as suas perguntas na plataforma para criar um protocolo de entrevistas (consistente e repetível) que os stakeholders podem usar para os seus diálogos com candidatos, o que os ajuda a fazer comparações justas e correctas. Além disso, podem ser usados algoritmos para sinalizar e interpretar sinais de talento relevantes (expressões faciais, tom de voz, emoções como ansiedade e entusiasmo, linguagem, cadência, enfoque, etc.), substituindo as observações humanas e inferências intuitivas por triagens e classificações estimuladas por dados.

As pesquisas há muito sugerem que as entrevistas de emprego são mais preditivas quando são altamente uniformizadas – ou seja, quando todos os entrevistados passam pelo mesmo processo e existe uma classificação predefinida para compreender as respostas. Tendo isto em conta, as entrevistas em vídeo podem aumentar o rigor das descobertas nas entrevistas, reduzindo os custos e fazendo com que as organizações de contratações operem com escala.

Uma questão sobre essas plataformas é a sua tendência para imitar e reforçar tendências inerentes a qualquer processo de entrevista. Isso é certamente uma limitação. Se as pessoas responsáveis pelas contratações forem, elas próprias, tendenciosas, não é de esperar que a IA acabe com esse problema. Para complicar ainda mais a questão, se essas mesmas pessoas tiverem de avaliar o desempenho dos recém-contratados, as suas tendências serão ocultadas. Do ponto de vista estatístico, podem ter previsto correctamente o desempenho futuro com a sua selecção de candidatos – mas até certo ponto, essa profecia cumpre-se a si própria.

É claro que tomar decisões tendenciosas sobre os resultados que avaliam o desempenho é algo que não mudará com os modelos de aprendizagem das máquinas (embora se obtenham resultados mais rápidos). Uma forma de abordar esta questão é criar um menor enfoque nos traços individuais, por exemplo, e um maior enfoque nos resultados de grupo, como os números de produtividade e de receitas.

Para os gestores também é útil usar análises 360, porque distribuem as avaliações do desempenho por diferentes stakeholders, mitigando as tendências individuais. Outra opção é “ensinar” os algoritmos de forma a ignorarem os sinais que prevêem as tendências humanas, mas não o desempenho profissional (como o género, idade, classe social e raça).

 

Exploração dos dados dos candidatos

A terceira nova abordagem, explorar passivamente os dados sobre os candidatos e analisar o rasto digital das pessoas, está também a crescer rapidamente. Ainda que seja mais usada para entregar mensagens personalizadas no Marketing e na Publicidade, é igualmente aplicável na identificação de talento nos Recursos Humanos. O comportamento online pode revelar informações sobre interesses, personalidades e capacidades dos indivíduos, o que por sua vez adivinha a sua adequabilidade para cargos ou carreiras em particular. Por exemplo, muitos responsáveis por contratações investigam agora a reputação dos candidatos, o que seguem e o nível de autoridade em redes como o LinkedIn e o Facebook, e usam essa informação para classificarem as pessoas. O LinkedIn fornece ferramentas que fazem isto automaticamente para os recrutadores, dando uma gama de classificações que ajudam a avaliar candidatos. Embora haja uma grande diferença entre métricas de popularidade e potencial real, os sites de networking representam um feedback real dos pares, por isso os recrutadores consideram-nos muito preditivos.

A análise passiva a dados tem sido cuidadosamente examinada em estudos que sublinham ligações consistentes entre a actividade nas redes sociais das pessoas e qualidades importantes para o cargo que irão desempenhar. Há, porém, um lado negro nesta capacidade, porque expõe a vida pessoal dos candidatos a um intenso escrutínio. Mesmo que a fronteira entre a vida pública e privada se tenha esbatido, é ético assegurar que as pessoas sabem como os seus dados são usados.

 

É essencial que quaisquer ferramentas para a avaliação de talento e recrutamento sigam directrizes éticas.