O percurso de Isabel Borgas começou cedo e é diversificado. Faz parte de uma geração de profissionais que «precisou arriscar», muito focada na auto aprendizagem e no crescimento interno. «Sem a superação das dificuldades e das adversidades não saímos do sítio.»
Entrevista a Isabel Borgas, diretora de Pessoas e Organização da NOS
Não foi na Gestão de Pessoas que Isabel Borgas, atualmente diretora de Pessoas e Organização da NOS, começou, mas a ligação às pessoas esteve «sempre lá. Primeiro eram clientes, depois passaram a ser colaboradores, mas foram sempre pessoas.»
Na sua adolescência, quais eram as suas áreas de interesse e o que se imaginava a fazer profissionalmente?
Até aos meus 14 anos sonhava com ser cirurgiã plástica, não tanto pela vertente estética, mas pela magia que era possível fazer-se com recurso à cirurgia em situações traumáticas. A partir do 9.º ano o meu desamor pela matemática atraiçoou-me e afastei-me de toda e qualquer paixão ligada à medicina, optando no secundário pela área que na altura se chamava “humanidades”.
Que curso universitário escolheu depois e porquê?
A primeira opção foram as Línguas e Literaturas Modernas, na variante de francês e inglês. No fim do primeiro ano percebi que a minha vocação não passaria por ser professora e com acabei no Instituto Superior de Línguas e Administração.
O que recorda de quando começou a trabalhar?
Sempre adorei viajar e conhecer culturas diferentes e na determinação de ser independente e fazer as férias que queria, comecei a trabalhar muito cedo, em part time, como hospedeira. Talvez o que recorde com maior clareza sejam os tempos nas grandes feiras de automóveis da época em que trabalhei para a Citroën. Era um trabalho intenso, mas muito bem remunerado e que me veio a abrir portas às oportunidades que se seguiram.
De hospedeira, passei a coordenadora, às feiras e certames seguiram-se os congressos médicos… até ao meu primeiro trabalho “a sério”, como account manager numa agência de comunicação.
Como compara essa "época" com os dias de hoje? Pensando nos profissionais que agora estão a entrar no mundo do trabalho, diria que a forma como se encara o trabalho, as prioridades e os receios, mudaram significativamente?
Acho que são mesmo épocas muito diferentes. Vivemos num mundo muito diferente. As gerações atuais são gerações do mundo com tudo o que isso significa: têm muitíssimo mais informação, mais oportunidades por estarem num mercado verdadeiramente global, a relação da oferta com a procura é, agora, totalmente invertida, criando muitas vezes uma falsa sensação de “fartura”. As escolhas são muito mais baseadas na médias que conseguem atingir à entrada e à saída da universidade, do que nas suas opções pessoais e nas experiências que vão tendo – e mesmo essas acabam por ser padronizadas, pois o próprio escrutínio é balizado pelas mesmas referencias.
Eu tive o privilégio de poder experimentar, errar e aprender, fazendo escolhas, umas vezes mais acertadas do que outras, mas ir caminhando com passadas seguras. Pertenço a uma geração de profissionais que precisou de arriscar, que se revelaram resilientes, leais, dedicados e muito focados na auto aprendizagem e no crescimento interno.
Dos jovens profissionais que entram agora no mercado de trabalho, esperam-se mais certezas, mas pela proteção e pela forma como são “transportados”, estão muitas vezes deslocados da dinâmica e da intensidade da realidade.
Os receios não são diferentes, a forma como lidam com eles é que mudou muito, perante a incerteza, o desconhecido ou o insucesso tendem a desistir e a solução é, quase sempre, mudar de emprego. Há uma redescoberta do conceito de “carreira”.
O seu percurso profissional “mais a sério”, como disse, começou em agências de Comunicação e Publicidade, na direção de Contas, mas consolidar-se-ia na área de Comunicação Corporativa, primeiro na Sonaecom e mais tarde na NOS. Entretanto assumiu o desafio de liderar a área de Pessoas e Organização. Como surge esta ligação à Gestão de Pessoas?
A ligação às pessoas esteve sempre lá. Primeiro eram clientes, depois passaram a ser colaboradores, mas foram sempre pessoas. As pessoas são o primeiro e mais importante cliente de cada organização. Se não “a compram”, não lhe dão a vida devida.
O que destacaria em cada fase do seu percurso profissional? Quais as principais aprendizagens?
Somos o resultado das histórias que vivemos e das pessoas que conhecemos. E aí sou mesmo uma privilegiada. Em todas as etapas da minha carreira tive sempre a sorte de conhecer pessoas que, de uma forma ou de outra, me impactaram, ajudaram a melhorar e a crescer. Umas vezes foram os líderes das organizações em que me pude integrar, outras vezes alguns pares e, muitas vezes mesmos, as equipas que pude conhecer.
Procurei em todos os momentos ajustar-me às exigências de cada missão e de cada desafio. Este ajustar não foi apenas na aquisição de conhecimento mas muito na abordagem às situações e às performances. Crescer é também, e muito, aprender a tirar o devido partido de cada experiência em benefício do que somos e do que fazemos.
Consegue identificar uma conquista que a tenha deixado particularmente orgulhosa ou com sentimento de missão cumprida?
Consigo identificar várias! Adoro o que faço hoje, da mesma forma que adorava o que fazia anteriormente. Como disse, tive o privilégio de, ao longo do meu percurso profissional, trabalhar com pessoas extraordinárias - chefias, equipas e pares -, e fazer parte de projetos extraordinários. Tenho muitas missões cumpridas! Sou daquelas pessoas que acredita que a teoria e as boas intenções não bastam, é preciso concretizar, fazer acontecer, e isso é o que tenho feito ao longo dos meus percursos.
E alguma decisão/ situação que tenha sido particularmente difícil/ desafiante?
Tantas, também. Mas é por isso que aqui estamos. Sem a superação das dificuldades e das adversidades não saímos do sítio. Faz mesmo parte: o nosso processo de expansão passa muito pela capacidade que tivermos de ultrapassar em “modo bem” as múltiplas e invariáveis perturbações que nos vão surgindo nos nossos caminhos.
O Simon Sinek tem uma “imagem” muito interessante que, ainda que outro propósito, cola bem aqui e que é a da criança que quando aprende a andar cai centenas de vezes e, mesmo assim, em momento algum pode dizer “ahh, acho que isto de andar de pé não é bem a minha coisa”…
Atualmente, quais são os seus principais desafios?
Os meus desafios principais são exatamente os mesmos da organização para a qual trabalho. Entregar – e continuar a entregar – a melhor experiencia aos nossos clientes. E, para tal, ter o talento certo, devidamente motivado, alinhado, num ambiente de trabalho que privilegia a felicidade como o melhor caminho para os bons resultados.
E dos gestores de Pessoas, em geral, quais acredita que serão os principais desafios nos próximos anos?
O contexto dos dois últimos anos e o avanço da tecnologia acelerou muito o desafio da atração e retenção de talento. Vamos ter de reinventar estratégias e arriscar nas abordagens se quisermos vencer num mercado cada vez mais global e mais competitivo.
Numa dimensão bastante diferente, acho que vamos sentir de forma inequívoca os impactos de uma sociedade exausta e angustiada e ser desafiados a endereçar da forma certa os temas do bem-estar e saúde mental, com o burnout a ser identificado pela Organização Nacional de Saúde como a doença século XXI.
Para além disto, será uma enorme desafio passar para o ensino as preocupações do mercado de trabalho, para que possam ajudar os estudantes a chegarem melhor preparados às etapas de entrada no mercado de trabalho. Seja em termos científicos e académicos, seja nas restantes dimensões da sua formação.
Quem é a Isabel, para lá da profissional?
Uma menina de totós, com uma saia rodada e sapatos de feijão, sempre a brincar com balões e lápis de colorir. Alguém que continua a gostar de se surpreender.