Muito se profetizou no último ano sobre o fim da necessidade de deslocação e presença física para comprar, ditando-se em extremismo o fim das lojas físicas, a total comodidade do digital e o consequente boom do e-commerce. A questão é que de um momento para o outro, passámos a viver praticamente à distância, impactando todo o tipo de atividades dos mais diferenciados setores e novos hábitos foram criados. Com isso, novas preferências e aspetos como não perder tempo, não fazer esforço e ter uma boa experiência, passaram a ser ainda mais críticos no processo de compra e/ou na relação com uma marca do que no período pré-pandemia.
Com o fim das limitações dos espaços e o maior desconfinamento vivido em Portugal desde março de 2020, sentimos nesta rentrée a vontade de sair de casa, de conviver, de sentir e estar em conversa longe do ecrã. A verdade é que somos seres com vários sentidos, com necessidade de socialização, de conhecer e viver novas experiências, sendo essas apenas possíveis, na maioria das vezes, quando nos propomos a viver em presença e não atrás de um ecrã.
A pandemia transformou a forma como nós sentimos o presencial. Se nos dispomos a estar presentes é porque daí queremos trazer valor acrescentado, conferindo-lhe assim uma necessidade de superação das nossas expectativas ainda maior do que anteriormente, obrigando assim o sector do retalho presencial ao maior desafio de todos para continuar a representar um grande valor comercial na sua marca: o de conhecer o seu novo cliente.
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Após um dos piores períodos de sempre em visitas e várias adaptações às restrições que a pandemia impunha, a recuperação deste ano do sector do Retalho e das compras presenciais, mostra-nos que nem só de digital se vive. O estudo “Global Consumer Insights Pulse Survey”, realizado pela consultora multinacional Pwc, analisou a frequência de compras, de acordo com os diferentes canais para fazer compras e concluiu que de 2020 para 2021, foi registada uma queda de 12% na utilização das loja físicas. Já do primeiro semestre de 2021, para o segundo semestre do ano, houve uma recuperação de 10%.
A verdade é que as tendências que já se vinham a sentir no sector do Retalho nos ditavam que o caminho é a omnicanalidade e a digitalização. Já se sabia que é fundamental conhecer na loja o resultado das interações do cliente noutros canais e a necessidade de acrescentar valor e conhecimento ao lojista dando-lhe a conhecer, por exemplo, que produtos o cliente já tinha visto no site, mas aproveitando a loja como um canal de maior confiança para realmente efetivar uma compra. Práticas como propor descontos via app assim que o cliente entra na loja, ou permitir obter a senha e notificação de chamada sem precisar de estar presente à espera da sua vez no atendimento são já também bastante utilizadas.
A transformação digital vai continuar a acelerar ainda mais na próxima década e vai estar focada não só em facilitar o trabalho dos lojistas, mas especialmente em garantir os básicos ao nível de esforço, rapidez e aposta na solução que melhor se adequa ao cliente. Fica agora o desafio de lhe superar as expectativas, de garantir que a experiência de contactar com a marca é não só excelente, como altamente recomendada aos amigos.
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Estima-se que consumidores com fortes relações com as marcas gastam 2,6 vezes mais do que o consumidor geral. Esta é a aposta certa para ultrapassar a competitividade no mercado, que se traduz numa maior dificuldade em garantir a retenção e a lealdade dos clientes.
É para isso fundamental apostar em re-converter também o papel do lojista. Apostar na sua formação, aumentar a atratividade da função, porque a implementação da nova visão para a experiência do cliente, vai trazer ainda mais desafios de complexidade de resolução e satisfação ao novo cliente que é mais digital, mais informado e sem nenhuma vontade de fazer esforço e perder tempo. É necessário trabalhar as equipas de lojistas de forma a garantir que as interações com o cliente respondem às suas necessidades e expectativas, reduzem os sentimentos negativos e aumentam também positivos em relação à marca.
Há alguns anos quando era responsável de formação para equipas de vendas, abordava os pontos que para mim eram os 3 momentos-chave para uma boa experiência do cliente:
1) diagnóstico da vontade e condição do cliente;
2) criação rapport e de empatia;
3) propor e fechar com benefícios da oferta, totalmente personalizados àquele cliente.
Sabemos que o desafio de uniformizar os comportamentos entre equipas, com várias geografias e diversos canais e, muito importante, atrair e reter os que realmente têm perfil para ser os nossos lojistas-embaixadores é também, aos dias de hoje, enorme, mas requer investimento porque esta parte do puzzle compromete toda a estratégia da marca.
Dizemos que as lojas são a cara da Empresa, por isso, muitas que só viviam no digital passaram recentemente a disponibilizar lojas físicas, mesmo que mantendo conceitos chave como a “descomplicação para pagar”, podendo assim investir mais na relação e na experiência do cliente.
A pergunta-chave para medir se a estratégia atual está correta é: “a experiência que o meu cliente tem em loja torna-o embaixador da minha marca?” ou “estou a provocar-lhe uma boa experiência nesta visita?”
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O relatório do setor retalhista "The Convergence Continuum", revelou que 49% da amostra inquirida (com idades entre os 18 e os 35 anos - os chamados “cliente-futuro”) afirmou que o momento preferido da experiência em loja é aquele em que toca nos produtos e os experimentam e 21% afirma vir à loja só para poder experimentar coisas novas.
Sabemos já que as lojas vão deixar cair a processualização do processo de compra e passar a acrescentar valor à jornada do cliente apostando em serem locais extremamente sensoriais, com o dom de provocar ao cliente, uma vontade genuína de o conhecer, não só por aquilo que oferece mas pelo momento que proporciona.
Reconhecendo a total conveniência e acesso que o mercado online permite, as marcas necessitam de apelar a todos os fatores humanos que essa realidade não permite. O toque, o cheiro, a interação com o produto, o experimentar. Estas são algumas das armas que jogam a seu favor e que se assumem como a chave para cativar este “novo público”. As lojas vão passar a locais onde os cliente vêm passar por bons momentos ao mesmo tempo que compram.
O desafio é o futuro que se avizinha muito incerto exatamente pela ausência de perceção concreta do perfil do cliente dos espaços físicos e sobre as suas preferências sobre os produtos que serão mais adquiridos online ou presencialmente.
As marcas devem estar preparadas para atuar rapidamente tendo em mente que o novo cliente tem vindo também a mostrar cada vez maior preocupação com a ética das marcas e sustentabilidade ambiental, maior sensibilidade ao preço e maior procura nas lojas de rua do seu bairro.